O Encontro do Dia Mundial da EM foi show!!!!
Euzinha falando no Encontro do Dia Mundial da EM |
Oi queridos, tudo bem com vocês?
Sábado fez um liiiindo dia de sol, pra ninguém ter a desculpa de que o tempo tava ruim e por isso não foi no encontro da Agapem. Tá bom, àqueles a quem a EM pegou de jeito no sábado também tá perdoado. E quem fez pulso no dia também. Agora, quem não foi de preguicinha ou porque não fez um esforcinho a mais pra sair de casa, bom, esses perderam de ter uma tarde agradável com amigos e informações novas e ótimas sobre EM.
Primeiro eu quero agradecer novamente a Agapem pela confiança e pela parceria. Acho que juntos podemos fazer muito mais coisas e ter uma voz mais forte na sociedade. E a Agapem está de parabéns, principalmente meus amigos Tiago e Giane, que mesmo em meio a surtos e pulsos continuam o trabalho para que mais pessoas saibam o que é a EM e lutam para que a gente possa ter melhor qualidade de vida.
Um resuminho do que aconteceu lá eu conto hoje aqui. Mas os abraços apertados, os sorrisos e a alegria de encontrar e reencontrar amigos, essa eu não posso passar pra vocês né.
Os trabalhos começaram, oficialmente, com a fala da psicóloga Maureen Moraes. Adorei conhecer a Maureen (que eu só conhecia pelo face) e de ouvir a experiência dela atendendo um grupo de pessoas com EM e outro grupo de familiares de pessoas com EM. Achei bem interessante e super importante tudo o que ela falou. Assim como eu, ela partilha da ideia de que quando uma pessoa da família tem o diagnóstico, a família toda tem e isso precisa ser trabalhado e acompanhado por alguém de fora e com conhecimento para tanto.
Pensando nisso, a Maureen e a Agapem estão conversando para oferecer um serviço de atendimento psicológico para as pessoas com EM do RS. Acho que vai ser um trabalho sensacional! Aguardemos as novidades...
Depois da Maureen os neurologistas Dra. Maria Cecília de Vecino e Dr. Márcio Menna Barreto falaram sobre a precocidade do diagnóstico e do quanto é difícil o diagnóstico de EM. Além disso, falaram algo que eu digo há 13 anos: os médicos precisam saber lidar com os adolescentes que chegam no consultório. Se é difícil achar um neurologista especialista em EM, um neuro-pediatra especializado é mais complicado ainda. Então esses neurologistas estão tendo que aprender a lidar com os adolescentes que chegam nos seus consultórios e acabam tendo o diagnóstico de EM.
Também comentaram sobre as medicações que temos hoje em dia no mercado e sobre o que está chegando. Pela fala dos dois médicos, estamos passando por uma fase maravilhosa de descobertas científicas e antigas promessas estão virando realidade. Ainda não temos a cura, mas podemos comemorar que as medicações que temos à disposição estão nos ajudando, e muito, a melhorar qualidade de vida de quem tem EM.
Adorei ouvir os dois falarem. Como é bom ouvir gente inteligente e que entende do assunto né? Além disso, o Dr. Márcio, que se revelou um fã de aplicativos tecnológicos comentou sobre um aplicativo que facilita nossa vida na hora de escrever. Como eu uso esses aplicativos e acho que podem ajudar mais pessoas, estou preparando um post com alguns deles pra todos vocês testarem.
Bom, aí foi a bonita aqui lá pra frente falar. Fiquei muito emocionada com a apresentação que o Tiago fez de mim e muito emocionada também em reconhecer, ali naquelas cadeiras, alguns rostos que eu vejo curtindo as postagens do blog no facebook, outros que comentam regularmente aqui no blog, outros que me mandam emails. Não via a hora de abraçar cada um de vocês. Mas eu tinha que me segurar né, afinal, tinha coisas pra falar e não podia dar uma de manteiga derretida e chorar ali na frente. Mas, vocês sabem, é emoção demais... e às vezes a emoção transborda e inunda os olhos né?
Eu tinha preparado um texto, caso me desse um branco na hora de falar. Mas com as falas anteriores a minha e com tantos pensamentos, a minha cabeça tava mais pra arco-íris do que pra branco. O negócio era selecionar rapidamente algumas das coisas que eu tinha planejado falar pra dar tempo de dizer ali na hora. Decidi que ia priorizar o tema "jovens com EM" e falar o que eu pensava que era mais diferente entre ter o diagnóstico aos 14 anos. Porque tem coisas que são comuns né.
Eu não tenho como lembrar o que eu realmente acabei falando lá, mas coloco aqui pra vocês o texto que me guiava:
Ter o diagnóstico de uma doença incurável, crônica e que pode trazer diversas limitações é uma coisa que tira o chão de qualquer pessoa. Independente da idade que se tenha no dia do diagnóstico, a gente sai do consultório pensando “eu quero a minha mãe”. Porque o diagnóstico nos tira certezas, seguranças, muda nossa vida completamente e a gente sai do consultório sem saber o que pensar ou o que fazer. Com 14 ou 50 anos, a gente sai querendo colo. Então, nesse sentido, não há muita diferença se se é novo ou velho. Todos saímos anestesiados do consultório médico, sem saber o que fazer com esse diagnóstico, sem saber com quem conversar, pra quem contar, com quem contar.
Quando alguém me pergunta se a EM muda a vida das pessoas, eu sempre respondo que lógicamente que muda. Mas mudanças nem sempre são ruins. É verdade que no início a gente não sabe como lidar com tudo isso, mas com o tempo se acostuma. É como quando a gente se muda de cidade. A gente não deixa de ser a gente só porque mudou de cidade. Nem deixa de comer, trabalhar, se divertir, sair na rua só porque mudou da cidade. Só que agora a gente passa por outras ruas, conhece outras pessoas, passa por novas experiências, conhece novas histórias. Mudar não quer dizer que vai ser ruim. Só quer dizer que vai ser diferente. Mudanças podem ser maravilhosas. Mas assim como quando nos mudamos de cidade, se continuarmos lamentando a não existência da praça preferida ou do restaurante que gostava na cidade velha, nunca vai se curtir as paisagens e os sabores da cidade nova.
Primeiro, queria lembrar a todos que quando uma pessoa da nossa família tem o diagnóstico de EM, toda a família tem esse diagnóstico. Não é só ela que se muda, todos passam por essa mudança. Quando se é adulto, as preocupações costumam ser o trabalho, como sustentar a família, como conciliar tratamento e trabalho, como pagar os remédios, o fisioterapeuta, etc.
Quando se tem 14 anos as preocupações são outras. Eu me preocupava se eu ia conseguir continuar estudando. Porque a minha única obrigação, meu único dever era esse. E quando se tem 14 anos a família fica doente junto com você. Principalmente as mães. Com essa idade não se é completamente ignorante quanto as coisas do mundo, mas quem realmente se preocupa são os pais. Porque quando eles nos criam mais ou menos pensam num futuro feliz pros seus filhos. E um diagnóstico desses dá um corte nesse desenho de futuro.
Além disso, as mães sentem que não estamos bem e não podem fazer nada. Eu sempre digo que as mães sofrem mais. Porque eu tenho a dor, eu sei o que estou sentindo, mas nem sempre consigo explicar. E ela fica ali, sofrendo com a impotência. Por não poder fazer nada.
Isso é uma das coisas que acho que é diferente de ter o diagnóstico com pouca idade. O sofrimento familiar é muito grande. E aí fica um círculo vicioso de sofrimento porque os pais sofrem por não poderem fazer quase nada e o adolescente sofre porque não consegue suprir as expectativas dos pais. Muitas vezes, pra não ver a família sofrer, a gente sofre sozinho. Talvez vocês não lembrem, mas quando se tem 14, 15 anos a gente faz coisas ligadas à família: ou a gente faz coisas pra agradar, ou pra chocar, ou pra chamar a atenção. Então ver a família sofrendo com uma coisa que é tua é muito dolorido e muito difícil. Porque a gente não pode fazer nada também. Não pode tirar os sintomas da doença e esconder numa gaveta.
E aí o que os pais fazem? Levam os filhos em outros médicos, na esperança de ter uma resposta diferente, melhor. E comigo não foi diferente. Como eu morava no interior, viemos em Porto Alegre pra poder consultar um especialista. Como eu nunca tive aparência de doente, esse médico me virou do avesso, achou que podia ser deficiência de vitamina B ou qualquer outra coisa. Mas as lesões estavam ali e os sintomas também. Mas, por falta de sensibilidade dele e por conta da minha pouca idade, ele me disse que achava que eu não sentia aquilo que eu dizia, que na verdade eu fazia aquilo pra chamar a atenção dos meus pais.
Eu saí arrasada da consulta. Eu jamais inventaria que não consigo andar em linha reta pra chamar atenção dos meus pais. Mas por ser adolescente aquele médico achou que podia dizer isso. Disse que eu podia começar um tratamento com remédios, mas que deveria ir num psiquiatra. Ele supôs que eu estivesse fazendo isso pra chamar a atenção porque a minha irmã tem deficiência mental e que, talvez, eu estivesse querendo a atenção que meus pais davam a ela. Obviamente ele não conhecia a minha família e não sabe que quanto mais amor se dá, mais amor se tem para dar. Mas isso não vem ao caso.
Eu sempre fui muito perfeccionista e sempre cobrei muito de mim. Nesse momento eu pensei que eu não estava fazendo o suficiente. E o pior de tudo é que eu acreditei nele. Porque quando se tem 16 anos, pouco conhecimento sobre a doença, sofrimento diário por conta duma doença que toma conta dos teus dias e sua segurança tá lá no dedo do pé e um médico vem e diz: olha, os exames dizem pouca coisa, acho que tu tá inventando isso. Tu acaba acreditando.
Mesmo com minha mãe dizendo que acreditava em mim e falando que aquele médico não me conhecia mas ela sim, eu acreditei nele. E a cada sintoma novo que eu sentia, eu dizia pra mim mesma que era invenção da minha cabeça e que eu deveria me esforçar mais pra não sentir porque era bobagem. Mas aí as coisas pioraram e pioraram muito. E por eu ir escondendo tudo que eu sentia, cheguei no fundo do fundo do poço. Eu sentia tanta dor a ponto de não dormir uma semana. E num surto arrasador eu perdi o controle do meu corpo todo. E quando eu digo todo, é todo mesmo. Nesse momento a minha preocupação não era mais se eu ia estudar ou caminhar, era se eu ia conseguir voltar a comer sozinha. Porque se era pra eu ficar numa cadeira de rodas, pelo menos trocar os canais de TV sozinha eu queria conseguir.
Isso é um alerta para os pais e para os médicos: mesmo que um adolescente esteja fazendo algo pra chamar atenção, custa prestar atenção nos sintomas dele? Custa acreditar no que uma pessoa em sofrimento está dizendo?
Se minha mãe não tivesse dado tanto valor pra um formigamentozinho na minha mão direita, eu poderia ter sequelas irreversíveis hoje. Criança e adolescente é ser humano e merece ser ouvido e respeitado em toda e qualquer circunstância. Chega de dizer que é coisa de criança! Assim como chega de dizer que é coisa de velho! Sempre achei muito engraçado essa coisa de alguns adultos acharem que são donos da verdade e que não deve ouvir o que os outros têm a dizer.
Eu aprendi muito cedo a diferença entre colegas e amigos. Porque nesse momento, eu fiquei dois meses sem ir à escola e ninguém apareceu. Nenhuma daquelas meninas fofoletes que viviam planejando festinhas na minha casa apareceram. Nem ligaram. Isso pra um adolescente em tempos que não existia facebook, nem Orkut, nem o falecido MSN é algo arrasador. E quando eu voltei pra escola as coisas estavam muito diferentes. Eu estava muito diferente. Eu tinha me mudado, lembram?
Algumas coisas que me interessavam não eram os assuntos de interesse dessas pessoas. Eu continuava gostando de falar de festa, música, esporte, namoro, fofocas, novela, filmes, etc. Mas eu queria conversar sobre a minha fadiga. Sobre dor, sobre minhas preocupações para o futuro, que não era o vestibular. Eu tinha perdido o saco pra alguns assuntos e isso me afastou um pouco das pessoas com quem eu andava antes.
A minha sorte é que sempre tem loucos tão loucos quanto a gente no mundo.
Nessa hora, a importância de quem está junto é fundamental!
Uma das coisas importantes nesse processo é que minha mãe sempre me deixou fazer o que me desse na veneta. E meu médico nunca me disse “você pode isso, você não pode aquilo”. Eu sempre pude tudo! Até aprender o que eu podia fazer sozinha eu podia. E isso foi importante, porque eu aprendi os limites do meu corpo. Mesmo sendo dançarina, fui eu que decidi a hora que a dança seria só curtição e não treino de todos os dias. Eu que decidi a hora de comprar uma bengala. Eu que decidi a hora de começar a trabalhar e a hora de parar também.
As pessoas me perguntam sempre o que era ruim sobre ter EM com 14 anos. Eu digo que eu não sei o que era pior, se era ter 14 anos ou ter EM. Na época eu achava que adolescentes eram cruéis. Depois eu descobri que o ser humano é que é. Só que quando são adolescentes, a crueldade vem escancarada. No mundo adulto a crueldade se disfarça de hipocrisia.
A verdade é que ter EM é ruim em qualquer idade. Mas com 14 anos o problema é que a gente tá naquela fase em que a sociedade decidiu que a gente tem que virar gente, decidir o que quer da vida, começar a namorar, etc, etc, etc. E aí, além de me preocupar com a EM eu tinha que me preocupar com essas coisas também. Com quem eu ia me tornar. Até que um dia eu me enchi o saco e, quando perguntaram o que eu ia ser quando crescer eu respondia que ia ser salsicha. Oras, eu ia continuar sendo eu, só que mais velha, com mais experiências, mais conhecimento talvez. Enfim, ter 14 anos é difícil.
Uma das coisas que mais me agrada e mais me incomoda na EM é que ela é invisível. Sempre foi um paradoxo pra mim. Hoje em dia, com mais maturidade, segurança e sabendo como ligar o botão foda-se não penso muito nisso. Mas quando eu era bem mais nova eu pensava em ir pra escola com um gesso na perna. E cada vez que eu voltava de uma pulsoterapia eu dizia que ia raspar a cabeça pras pessoas entenderem que eu tava doente.
Isso é complicado. Porque eu não queria a pena das pessoas nem que elas fizessem as coisas pra mim porque eu tinha uma doença. Mas eu queria que as pessoas compreendessem que para mim ter um elevador num prédio de dois andares no colégio não era um privilégio, era uma condição. Que ter uma passagem especial no ônibus pra sentar nos bancos reservados não era mordomia, era condição pra eu poder ir estudar. Que andar de bengala não era pra eu aparecer ou chamar atenção, era condição pra eu sair de casa sozinha, sem medo de cair. Esses direitos que a gente tem por ter mobilidade reduzida não são mordomias ou privilégios, são condições. Hoje eu ligo o foda-se pras velhinhas no ônibus que me julgam antes de me perguntar porque eu estou sentada na vaga pra deficientes. Mas naquela época eu chegava em casa chorando. Hoje, sejamos sinceros, eu conto a minha história pras velhinhas e quem sai chorando do ônibus são elas. Claro que eu dramatizo bastante e faço cara de cachorro que caiu na mudança.
Mas é complicado. Lá em Passo Fundo quiseram me negar o direito de entrar no ônibus e sentar nos bancos reservados porque eu era muito bonita, pode isso? Ter uma doença e ser bem apessoada, inteligente, educada é quase um crime. Ter uma doença e ser nova então, é um absurdo. As pessoas perguntam “mas como? tão novinha?” eu sempre respondo “desculpa, eu não escolhi não, fora isso, doença não tem idade”.
Outra coisa que as pessoas me perguntam muito é o que eu aprendi com a EM. Bom, eu aprendi uma porção de coisas. Mas eu não gosto muito desse questionamento porque parece que endeusa a doença. Como se fosse uma coisa boa. E, sejamos sinceros, é uma merda ter EM. Ninguém queria ter, ninguém quer ter e tá todo mundo se tratando justamente pra que ela se torne menor possível em suas vidas.
Mas, tudo bem, já que a coisa tá aí, é melhor que a gente aprenda mesmo alguma coisa com ela. E o que eu aprendi com a minha EM, que hoje é uma pré-adolescente de 13 anos? Muuuita coisa. Mas o ensinamento mais importante que a EM me deu foi que eu não controlo a minha vida. E se alguém aqui acha que controla, lamento informar, mas não controla não. A gente controla as coisas até ali. Quem tem EM perde a ilusão de controlar a própria vida. Não estou dizendo que a EM controla nossa vida, claro que não. Mas ela tem um papel importantíssimo, não é? E a gente negar isso não nos leva adiante. A gente não controla a vida nem as coisas que acontecem, mas aprende a jogar esse jogo da melhor forma possível. A gente pode controlar como vai encarar essas coisas inesperadas que aparecem. Bom, aí eu comentei meu lema "ser feliz é melhor que ser normal", pra finalizar.
Quem foi no Encontro pode falar melhor sobre o que eu falei... eu dei um start e as coisas começaram a sair...hehehehe
Dr. Márcio Menna Barreto, Tiago Rodrigo dos Santos, tesoureiro da Agapem (e torcedor do time que perdeu a Champions League), Euzinha e minha querida neurologista, Dra. Maria Cecília de Vecino |
E no final, lanchinho pra todo mundo poder conversar, se conhecer melhor, trocar contatos, etc.
Eu contei por volta de 60 pessoas nesse encontro. E fico muito feliz de ter visto muitas carinhas novas por lá.
As ideias surgidas nesse encontro não acabam por aqui, mas vou postando nos próximos dias, pra não cansar a beleza de vocês nem a minha.
No site da Agapem dá pra ouvir a entrevista que eu e o Paulo, da ONG Saúde pra Todos demos à Rádio Guaíba na sexta-feira à tarde, convidando as pessoas ao evento e a entrevista que o Dr. Jorge Luiz Winkler deu à Rádio Gaúcha na manhã de sábado: http://www.agapem.org.br/portal/
Mais uma vez, obrigada Agapem por proporcionar uma tarde tão agradável a todos nós. E bóra trabalhar né? Hehehehehhe
Até mais!
Bjs
p.s.: todas as fotos do evento podem ser conferidas na fanpage da Agapem no facebook: https://www.facebook.com/pages/Agapem/128423233975771?ref=ts&fref=ts
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